domingo, 24 de março de 2013

Conversa Branca


Conversa Branca!

Paulo Lucio – Carteirinho
Membro do Movimento Vermelho de Cataguases

O programa de humor do momento é o seriado: Pé na Cova. Do dramaturgo Miguel Falabella. O programa é parecido com o Sai de Baixo, outro  sucesso de Falabella, sendo a diferença  o cenário. Em  Sai de Baixo as cenas  passavam na classe A, num  prédio da Zona Sul,  já em  Pé na Cova  na Classe C, na  FUI -Funerária Unidos de Irajá -  no subúrbio.  
O programa tem como ator principal o  patriarca  Ruço (próprio Miguel Falabella), e trata questões  polêmicas: morte, política, preconceito, subemprego, homossexualidade.... com  muita irreverência. Com destaque para os trajes, gírias e o comportamento social.
Citei o programa para falar de um tema bastante polêmico, o preconceito racial, a primeira cena do programa. Falabella tratou desse tema de forma fantástica, mostrando um  comercial de margarina  onde mostra  uma família branca na mesa comendo pão com margarina. A princípio uma cena normal. Mas na verdade uma brilhante sátira  ao preconceito invisível.  Para reforçar,   a personagem negra do programa  assistindo ao  comercial levanta uma questão: ” Por que o comercial mostra uma família branca e rica se quem mais consome margarina é a população negra e pobre?”. 
Se fizemos uma leitura melhor, iremos perceber  que é uma questão cultural, onde a grande maioria dos comerciais são todos idênticos, com  “garotos e garotas propagandas” de cor branca. A mídia criou a raça ariana e exibe 24 horas.
Dificilmente vemos comerciais onde uma pessoa negra  comprando um carro; fazendo compra no mercado; utilizando cartão de crédito; indo ao banco; usando o celular; viajando  de avião; curtindo um cruzeiro marítimo; indo ao shopping; tomando cerveja; ... a grande maioria são atores brancos. Padrão da TV.  Como se só os brancos consumissem. 
Nas novelas e filmes seguem essa cartilha. Prevalece a raça branca. Dificilmente encontramos os negros nos principais papéis. A maioria interpretam  papéis envolvendo escravos, empregados, bandidos, pobres... . Alguns negros se destacam, mas são minoria. Prevalece a raça branca.
De acordo com o Censo de 2010, 50,7% da população é negra ou mestiça. Enquanto 47,7% da população se definem como brancos.  Se os negros são maioria, por que os comerciais, novelas e filmes só mostram brancos?   
É o  preconceito invisível que está  cada vez mais visível!
Trago esse debate para a nossa cidade, onde também temos essas práticas.  Cito como exemplo programas de debates das rádios, que apesar de não podemos ver, tem cor. E é branca. Conversa Branca!
Os convidados e participantes são todos brancos. Afinal, só participam dos  programas: médicos, doutores, advogados, empresários, comerciantes, alto escalão do governo, promotores, juízes... pessoas de destaque na sociedade. Branquinhos que brilha.
Só  Cara Pálida!
Engraçado é quando o tema do debate são as cotas. Uma mesa de branco tratando do assunto. E é claro, a maioria são contra.  Dizem que não existe preconceito e que não precisa de cotas.  Mas será que ainda não perceberam que só os brancos que opinam? Isso não é preconceito?  Os que são contra as cotas, na verdade, querem manter seu domínio na sociedade. Temem perder espaço.  Não aceitam negros e pobres  disputando empregos;  as vagas de seus filhos nas escolas e universidades;  espaços na mídia; aparecendo no comercial da TV dirigindo um carrão sem que seja o motorista particular.
Mais engraçado ainda é quando o locutor quer mostrar que não tem preconceito e cita que o rapaz da técnica é negro. Lembro  dos coronéis que diziam que não tinham preconceitos e usavam como exemplo seus empregados, dizendo: “Meu mordomo é negro; meu capataz é negro; minha cozinheira é negra;... .  A madame da Zona Sul faz o mesmo, bate no peito dizendo: “Minha emprega é negra, não tenho preconceito.” Aproveito para citar a frase da campanha racial: “Onde você guarda o seu preconceito?”.
Voltando a primeira cena do seriado Pé na Cova, a empregada que  está servindo a mesa é negra. Ela prepara a mesa  para os brancos se alimentarem, não aparece comendo o pão.  O rapaz da técnica  negro é a mesma coisa , prepara o programa para os brancos falaram, não tem direito a falar. Como se não tivesse opinião.   Por que só os brancos participam dos programas?  
Se for mulher e negra sofre duas vezes,  enfrentando  o preconceito racial e  o machismo. As mulheres estão excluídas dos debates. Depois não entendem por que não temos mulheres vereadoras, lideranças femininas e  fazem teses, dizendo que mulher não vota em mulher. Jogando a responsabilidade para classe. Mas na verdade é por que estão excluídas dos debates.. Raramente são convidadas, sendo sempre as mesmas. Por que não convidam outras mulheres? Novos participantes?
Tem um ditado que diz: “Que não é visto não é lembrado”.  Devido os negros e as mulheres serem excluídos da mídia, não são lembrados. O que explica a carência de lideranças negras e de mulheres na nossa política.
A exclusão do negro explica por  que nossa mídia é chamada de Chapa Branca!
Talvez seja necessário criar um programa de cotas para participação dos programas de debates das rádios locais. Inserindo também  as mulheres, os gays,  os deficientes.. . Os “excluídos” da sociedade. 
Precisamos mudar a  cor da democracia, que é branca e encardida, sem brilho.  Nossa mídia está com o pé na cova.

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