segunda-feira, 7 de março de 2011

O "PAI" DO BOLSA FAMÍLIA

Todo domingo, por volta das nove horas da manhã, a Praça Rui Barbosa se transforma num grande espaço de debates políticos, que a cada dia ganha novos adeptos – e sempre que posso marco presença. Caso o caro leitor queira participar, basta comparecer na praça e se enturmar. . Vale destacar que o Ministério da Saúde adverte: Debata com moderação; e se beber não debata.

Voltando aos debates, vários são os temas, que vão desde conjuntura Municipal, Estadual, Federal e até mesmo mundial - onde, infelizmente, prevalece a alienação das mídias de direitas.

O antagonismo ideológico é notório, prevalecendo dois grupos: a turma da direita e turma da esquerda.

Todos os temas são debatidos de forma “bem democrática”, todos têm voz. Vale destacar que alguns tentam ganhar no grito. Sendo assim, se passar pela praça por volta desse horário e ouvir gritaria, não se assuste, muito menos chame a polícia. Fique tranqüilo, não é briga, apenas debate político.

Dos temas, o Bolsa Família é o mais debatido, sendo que o grande debate sobre o Bolsa Família é a respeito da paternidade. Apesar das críticas ao programa, a turma da direita insiste em dizer que foi o governo FHC que criou. Já a turma da esquerda diz quer foi o governo Lula.

Afinal de contas, quem é o “pai” do Bolsa Família?

Como diz o ditado: “filho bonito tem muitos pais”. Principalmente, quanto esse “filho” traz muitos votos. Visando colocar fim nesse impasse, faço um DNA, montando a árvore genealógica do programa no estilo do gibi japonês – mangá- onde se lê de trás para frente.

Começo pelo Governo Lula, que no ano de 2003, unificou, reuniu e ampliou os projetos: Auxílio Gás, Bolsa Alimentação, Bolsa Renda, Bolsa Escola... e outros programas- “criados no governo FHC”- tudo num só programa. Batizado de Bolsa Família. Sendo assim, podemos dizer que Lula não é o “pai”, apenas registrou.

FHC é o “pai” do Bolsa Família?

Não! Assim como Lula, FHC apadrinhou programas sociais municipais e estaduais já existentes, ampliando para a esfera federal, sendo o Bolsa Escola o primogênito. O Bolsa Escola foi implementado em 1995, no Governo do Distrito Federal, pelo então Governador, Cristóvão Buarque, que na época pertencia ao PT.

Cristóvão Buarque é o “pai” do Bolsa Família?

Também não! Cristóvão Buarque pode ser considerado “pai” do termo “Bolsa”, criando o Bolsa-Escola que foi inspirado no Programa de Renda Mínima, implantado em 1994, em Campinas, pelo então prefeito, Jose Roberto Magalhães Teixeira, do PSDB. O programa destinava um complemento em dinheiro à renda de famílias consideradas miseráveis (abaixo da linha da pobreza). Para receber o dinheiro, a família inscrita no programa deveria residir em Campinas há pelo menos dois anos, manter os filhos na escola e com bons resultados nos estudos, receber os funcionários da Assistência Social em suas casas periodicamente e freqüentar cursos profissionalizantes, entre outras obrigações.

Jose Roberto Magalhães Teixeira é o “pai” do Bolsa Família?

Também não! Na verdade Jose Roberto Magalhães Teixiera apenas se inspirou nos projetos e programas sociais do mineiro de Bocaiúva, Herbert José de Souza, mais conhecido como Betinho, sociólogo e importante ativista dos direitos humanos. Antes de comentar sobre os projetos e programas sociais que Betinho criou, conto um pouco de sua vida.

Betinho nasceu em 3 de novembro de 1935, na cidade de Bocaiúva, Minas Gerais. Irmão do cartunista Henfil e do músico Chico Mário, numa família de oito irmãos. Nos primeiros dias de vida foi acometido de hemofilia. Sua formação teve grande influência dos padres dominicanos, com os quais travou contato na década de 1950. Integrou a JEC (Juventude Estudantil Católica), a JUC (Juventude Universitária Católica) e, em 1962, fundou a AP (Ação Popular), da qual foi o primeiro coordenador. Formando em Sociologia no ano de 1962. Trabalhou no Ministério da Educação e Cultura e na Secretaria da Reforma Agrária.

Durante o golpe militar exilou-se no Uruguai. Quando retornou, conseguiu emprego como operário na cidade paulista de Mauá. Retornou ao exílio em 1971, morou no Chile, onde lecionou na Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais e trabalhou com o presidente Salvador Allende. Fugiu da ditadura chilena, morou no Canadá e México, fez doutorado na Universidade do México.

Em 1979, retornou ao Brasil, na Campamnha pela Anisitia aos presos e exilados políticos. Ao desembarcar no Aeroporto de Conganhas se deparou com uma manifestação, cerca de duzentas pessoas cantavam a canção “O bêbado e o equilibrista", de João Bosco e Aldir Blanc, gravada por Elis Regina. Canção que se tornou em hino contra a Ditadura Militar e que contém uma homenagem a Betinho "Meu Brasil / que sonha com a volta do irmão do Henfil / de tanta gente que partiu…".

Em 1981, fundou o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas), que anos mais tarde deu origem à Campanha Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. Em 1990, liderou o movimento Terra e Democracia que lutava pela democratização da terra. Nesta época, já lutava contra o HIV, adquirido em 1985, em transfusões de sangue no tratamento da hemofilia, de 1986 a 1997 dirigiu a ABIA, para defender os portadores do vírus da AIDS. Em 1992, liderou movimento político pelo impeachment do Collor.

Na luta contra a fome, promoveu debate sobre prover assistência a familias pobres e miseráveis. Betinho criou o Programa de Concessão de Benefícios e Ajuda, primeiro programa social, que eram feitos pontualmente e de forma indireta, geralmente com a distribuição de cestas básicas em áreas carentes, principalmente, do norte e nordeste.

Em 1993, lançou como palavra de ordem o combate a fome, elaborando o Plano Nacional de Segurança Alimentar que foi entregue ao presidente Itamar Franco. Com isso, a fome passou a integrar os debates nacionais e da imprensa. No mesmo ano, foi considerado “o homem de idéias do ano”.

Visando garantir um maior aproveitamento dos benefícios, bem como torná-los mais viáveis, logisticamente falando, Betinho deu os primeiros passos para tornar os benefícios em direitos e criando os primeiros programas de assistência sociais à população brasileira, que somente em 1995 foram “adotados” pelo Governo Federal, pelo então Presidente FHC, através do Programa de Rede de Proteção Social, com parcerias com o setor privado através das ONGs, sendo chamado de Comunidade Solidária. Apesar da concorrência entre Governo e ONGs – como terceiro poder- Betinho sabia de sua importância e que “não cabe às ONGs brasileiras acabar com ou pretender substituir o Estado, mas colaborar para a sua democratização”.

Em 1996, Betinho criou o Programa Natal Sem Fome. Destacou-se na luta pela reforma agrária. E achava “um absurdo um país com tanta terra ociosa assistir sua população vegetar na periferia das grandes cidades”. Betinho defendia a divisão da terra, porém encontrou dificuldades na “democracia” controlada por grandes latifundiários e que “muitas reformas se fizeram para dividir a terra, para torná-la de muitos e, quem sabe, até todas as pessoas. Mas isso não aconteceu em todos os lugares. A democracia esbarrou na cerca e se feriu nos seus arames farpados” – Betinho.

Betinho lutou contra a miséria até os últimos dias de sua vida. Falecendo em 9 de agosto de 1997, aos 61 anos, em sua casa no bairro de Botafogo. Foi autor de vários projetos e programas sociais, sendo o percussor do Balanço Social no Brasil. Sendo assim, o verdadeiro “pai” do Bolsa Família .

Betinho dedicou a vida na organização da sociedade, acreditando na política; de acordo com ele: “o Brasil tem fome de ética e passa fome em conseqüência da falta de ética na política”.

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